Em causa está uma alínea que previa que o vencedor do concurso para a construção do troço Poceirão-Caia da linha de alta velocidade, realizado há mais de 15 anos, fosse indemnizado caso o Tribunal de Contas chumbasse o projeto, como acabaria por acontecer.
O grupo Lena era membro minoritário desse consórcio, que conseguiu o direito a ser indemnizado em mais de 150 milhões de euros.
Para José Sócrates, entre "os cinco absurdos" desta acusação, está a alegação de o grupo Lena ter feito em 2007 "pagamentos corruptos de grande volume" para "um projeto que nunca existiu" e que "se destinavam a obter indemnizações do Estado que até hoje não foram pagas".
A ideia de que o antigo primeiro-ministro (2005-2011) teria um "desejo secreto" de que o projeto do TGV - uma das bandeiras do seu Governo - não fosse concretizado é outro absurdo, assum como a existência de "uma conspiração" com um outro arguido afastado pelo seu Governo do projeto, ou a convicção de que foi uma empresa minoritária (e não o consórcio) a fazer os pagamentos e com o objetivo de perder o concurso.
"É já uma manobra de desespero [do Ministério Público]: não temos nada para acusar, vamos buscar uma alínea", defendeu, no quinto dia do julgamento da Operação Marquês e quarto de interrogatório, o ex-governante socialista, assegurando que só soube da existência da cláusula em 2017.
José Sócrates acrescentou que a consequência da suspeita lançada pelo Ministério Público de que "o concurso foi manipulado" foi que, enquanto em Espanha se construíram 1.500 quilómetros de alta velocidade, em Portugal nada se fez.
O antigo primeiro-ministro, de 67 anos, está pronunciado (acusado após instrução) de 22 crimes, incluindo três de corrupção por ter, alegadamente, recebido dinheiro para beneficiar em dossiês distintos o grupo Lena, o Grupo Espírito Santo (GES), e o empreendimento Vale do Lobo, no Algarve.
O processo conta, no total, com 21 arguidos, que respondem globalmente por 117 crimes económico-financeiros.
O julgamento começou em 03 de julho, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, 11 anos depois de José Sócrates ter sido detido.
Os arguidos têm, em geral, negado a prática de qualquer ilícito.
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