A juíza relatora Joana Fernandes Costa declarou esta sexta-feira em conferência de imprensa a inconstitucionalidade de cinco normas que compõe a Lei de Estrangeiros, chumbando, assim, o documento.
O diploma será agora devolvido ao Parlamento para que sejam expurgadas as normas que violam a lei fundamental.
No total, Marcelo Rebelo de Sousa tinha pedido a fiscalização de sete normas constantes do decreto: destas sete, o TC chumbou cinco, considerando que as restantes duas são constitucionais.
Após a decisão do TC, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vetou as "alterações à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional".
No passado dia 24 de julho, o Presidente da República submeteu ao Tribunal Constitucional o decreto do Parlamento que altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, aprovado por PSD, Chega e CDS-PP.
O que é que o TC considerou inconstitucional?
Entre as normas chumbadas, estão várias relativas ao reagrupamento familiar, designadamente a que prevê que cidadãos estrangeiros com autorização de residência válida e que residem legalmente em Portugal têm direito ao reagrupamento familiar apenas com membros da sua família menores de idade, desde que estes tenham entrado legalmente em Portugal e residam no país.
O presidente do TC, José João Abrantes, salientou que esta norma, "ao não incluir o cônjuge ou equiparado, pode impor a desagregação da família" e pode conduzir "à separação dos membros da família constituída desse cidadão estrangeiro", o que disse traduzir-se numa violação de direitos constitucionais.
Da mesma forma, o presidente do TC disse ser inconstitucional outra norma do decreto que prevê que um cidadão, para pedir o reagrupamento familiar de membros da família que se encontrem no estrangeiro, tenha de residir legalmente no país há pelo menos dois anos.
José João Abrantes frisou que "a imposição de um prazo absoluto, isto é, de um prazo cego de dois anos", é "incompatível com a proteção constitucionalmente devida à família, em particular à convivência dos cônjuges ou equiparados entre si".
O TC declarou ainda inconstitucional outra norma que aumenta de três para nove meses o prazo para análise dos pedidos de reagrupamento familiar, que podem ser prorrogados por outros nove meses em "circunstâncias excecionais associadas à complexidade da análise do pedido".
José João Abrantes considerou que, "ao somar um prazo de decisão de nove meses, prorrogável até 18 meses", aos dois anos que os cidadãos estrangeiros teriam de esperar para poder pedir o reagrupamento familiar, esta norma "não é compatível com os deveres de proteção da família a que o Estado se encontra vinculado".
Outra das normas consideradas inconstitucionais prevê que os requerentes de reagrupamento familiar, assim como os membros famílias visados, "devem cumprir medidas de integração", como aprender a língua portuguesa e "os princípios e valores constitucionais portugueses", conforme seria "regulado em portaria dos membros do Governo".
O TC considerou que esta norma viola o princípio constitucional de que é "da exclusiva competência" da Assembleia da República legislar sobre direitos, liberdades e garantias, não podendo ser definida por portaria do Governo.
E onde é que o TC está alinhado com o Governo?
No entanto, o TC considerou constitucional a norma do decreto que estabelece que quem é titular de certas autorizações de residência, por atividade docente, de investimento ou cultural, tem direito "ao reagrupamento familiar com membros da família", mesmo que não sejam menores, como sucede com outras autorizações de residência, o que o Presidente da República considerou potencialmente discriminatório.
O presidente do TC considerou que esta norma "não se afigura desproporcionada nem discriminatória" relativamente ao artigo da Constituição que prevê que "ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual".
Marcelo tinha pedido fiscalização por dúvidas em 7 normas
No passado dia 24 de julho, o Presidente da República submeteu ao Tribunal Constitucional o decreto do Parlamento que altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, aprovado por PSD, Chega e CDS-PP.
O chefe de Estado pediu a fiscalização preventiva da constitucionalidade das normas sobre direito ao reagrupamento familiar e condições para o seu exercício, sobre o prazo para apreciação de pedidos pela Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) e o direito de recurso.
O novo regime, que limita os vistos para procura de trabalho ao "trabalho qualificado", restringe o reagrupamento familiar de imigrantes e altera as condições para concessão de autorização de residência a cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), tinha sido aprovado dias antes em plenário.
PS, Livre, PCP, BE, PAN e JPP votaram contra, enquanto a IL se absteve na votação final global do texto de substituição, elaborado a partir de uma proposta do Governo PSD/CDS-PP e de um projeto de lei do Chega.
Primeiro-ministro admitiu alterar o decreto
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, prometeu esta quinta-feira que, "se por um acaso, o TC entender que há alguma norma ou alguma solução de alguma norma não está completamente de acordo com a interpretação dos princípios constitucionais", a maioria que representa vai "acatar essa decisão e encontrar uma solução jurídica que possa respeitar a pronúncia do TC".
"Mas que possa também cumprir o objetivo. Ou seja, há uma coisa que fica muito clara: nós não vamos desistir do nosso objetivo, mesmo que haja alguma correção da redação da lei em virtude da pronúncia do TC", sublinhou.
[Notícia atualizada às 19h34]
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