A Assembleia da República aprovou, esta quarta-feira, a lei dos estrangeiros, uma 'luz verde' que fez com que se ouvissem críticas da Esquerda, com o Livre e o Bloco de Esquerda a anunciarem que vão pedir ao Presidente da República, Marcelo da República, que vete a lei.
As alterações foram aprovadas com os votos do Partido Social Democrata, Chega e CDS. Já a Iniciativa Liberal absteve-se na votação, com a bancada a justificar a alteração da posição porque o processo legislativo foi "absolutamente inadmissível da parte do Partido Social Democrata", com "propostas legislativas à 25.ª hora".
As alterações ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional tinham já sido aprovadas na Comissão de Assuntos Constitucionais no dia 11, com votos contra da Esquerda, que alegou atropelos à lei pela falta de pareceres obrigatórios.
Entre "atropelos" e 'visitas agendadas' a Belém, como reagiram os partidos?
Pela voz de Pedro Delgado Alves, o Partido Socialista criticou os "atropelos procedimentais" e a "hiper-rapidez" que o Governo imprimiu, sem que "tenha apresentado quaisquer pareceres", procurando impedir que constitucionalistas e membros das associações de imigrantes "participassem no processo legislativo."
"O Governo fez a escolha do seu parceiro", acrescentou Delgado Alves, referindo-se ao Chega, e apontando que o Executivo tinha optado por "uma agenda perigosa" que abre "as portas aos extremismos". "Por favor, não fiquem sequestrados pela extrema-direita", apelou à bancada social-democrata.
Já Inês Sousa Real, do PAN, criticou os "atropelos à lei" e recordou que as novas regras do reagrupamento familiar deveria exigir a audição da Comissão Nacional de Crianças e Jovens: "Todos reconhecemos que os fluxos migratórios têm de cumprir a lei", mas "tem de ser [um diploma] humanitário."
Por sua vez, Paula Santos, do PCP, considerou que se trata de um "processo em que se impediu a Assembleia da República de fazer um trabalho sério e ponderado" e houve "uma imposição de uma opção política que ataca direitos dos pobres e dos cidadãos da CPLP", ao contrário dos 'vistos gold' para quem "todos os direitos estão salvaguardados".
Filipe Sousa, do JPP, lamentou a rapidez do processo e criticou o "alcance extremamente complexo" do diploma que "vai afetar milhares de pessoas e de famílias".
BE e Livre anunciaram que vão pedir a Marcelo que vete lei
Para além das críticas à pressa mostrada pelo Executivo, tanto o Bloco de Esquerda como o Livre anunciaram que vão pedir a Marcelo que vete esta lei.
Em declarações aos jornalistas, Mariana Mortágua afirmou que o processo legislativo que permitiu hoje a aprovação das alterações à lei de estrangeiros "é uma mancha na história do Parlamento", porque foi feita "sem o devido debate, esclarecimento" e "sem as dúvidas constitucionais estarem resolvidas."
"Vamos fazer um pedido de audiência ao senhor Presidente da República para partilhar estas nossas dúvidas sobre a lei e para dar conta (...) de um processo legislativo que não respeita a importância desta lei, que não respeita as associações que estão no terreno, que não respeita a ordem e a forma como fazemos os processos legislativos na Assembleia da República", disse.
Também o Livre vai pedir 'uma hora' com Marcelo, explicando a líder parlamentar, Isabel Mendes Lopes, que o partido quer "fazer ver" a Marcelo Rebelo de Sousa como é que o processo legislativo decorreu no Parlamento, considerando que a "lei está feita mal logo de partida e, portanto, não deve ser promulgada".
"[Deve] voltar à Assembleia da República para que possa ser verdadeiramente discutida como uma lei desta importância deve ser: com tempo, com a contribuição de todos os grupos parlamentares e, sobretudo, ouvir as pessoas diretamente afetadas pela aplicação desta proposta de lei do Governo", argumentou a deputada.
E quem votou a favor?
Perante a situação, António Rodrigues, do PSD, recusou a ideia de que o seu partido não quer debater o tema e lamentou que o PS não tenha trazido propostas de alterações. "A matéria da imigração foi a mais discutida nos últimos 15 meses em Portugal", disse.
Os deputados socialistas "tiveram a oportunidade de propor, de refletir. A urgência exige-se por anos de incapacidade de legislar, por incapacidade de decidir", porque "queriam continuar no mesmo pântano em que estavam a viver".
Já Vanessa Barata (Chega) justificou a alteração da legislação com as "políticas irresponsáveis do PS", que promoveu uma "política de portas escancaradas, sem controlo e sem pensar nas consequências" para o país.
"Temos bairros inteiros em colapso, a insegurança crescente e uma precariedade que antes do mais atinge os nossos, os portugueses que cá vivem e cá trabalham", disse a deputada do Chega, terminando com uma citação do primeiro-ministro: "Deixem-nos trabalhar".
O Governo, por seu lado, pela voz do ministro da Presidência, António Leitão Amaro, reafirmou que o país precisava de uma política de imigração mais regulada, com mais controle, mas com humanismo e equilíbrio.
Na opinião do governante, o país necessitava de "orientar a sua imigração para uma imigração mais qualificada" para mudar o que acontecia "até há um ano" e que considerou ser "indigno para aqueles que vinham, que esperavam anos por documentos, viviam em condições desadequadas".
E Marcelo? Que diz?
Já na noite desta quarta-feira, Marcelo foi questionado, em Santarém, acerca da aprovação do Parlamento, e o chefe de Estado começou por confessar que não assistiu ao debate, nem viu as alterações, mas mostrou que já tem o seu plano muito bem traçado.
Salientando que vai abrir as portas aos partidos que querem ser recebidos, Marcelo apontou que ia começar por ver, tal como habitual, se a lei respeitava a Constituição.
Caso não tenha dúvidas do ponto de vista constitucional, Marcelo confessou que vai ponderar "o equilíbrio", e, em caso de inexistência de qualquer "ponto pormenor" que o impressionasse negativamente, não tem dúvidas: "Assino, promulgo."
Caso contrário, devolve ao Parlamento: "E peço: vejam lá isto. É mesmo para ser assim ou pode conhecer-se ou outra fórmula?"
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