A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) identificou 10 irregularidades que levaram a autuar empresas por incumprimento do direito das trabalhadoras a amamentar e fez 13 advertências a empregadores nos últimos cinco anos.
Apenas no ano de 2023 não houve qualquer empresa autuada, mas houve sempre advertências por "infrações aos normativos legais", revelou hoje à Lusa a ACT, salientando que os números de 2024 e deste ano ainda são provisórios.
Em causa estiveram três alíneas do artigo 47.º do Código do Trabalho que define as condições para a dispensa para amamentação para a mãe ou aleitação para o pai.
A 1.º alínea define que a "mãe que amamenta o filho tem direito a dispensa de trabalho para o efeito, durante o tempo que durar a amamentação", mas a ACT confirmou que algumas empresas não cumpriram esta regra e por isso avançou com cinco autuações e oito advertências nos últimos cinco anos.
Outra das infrações identificadas prendeu-se com a alínea que define que "a dispensa diária para amamentação ou aleitação é gozada em dois períodos distintos, com a duração máxima de uma hora cada, salvo se outro regime for acordado com o empregador", tendo resultado em cinco autuações e quatro advertências.
Também houve uma empresa que em 2023 foi advertida por não estar a cumprir corretamente a redução do tempo da licença para casos em que um dos progenitores trabalha a tempo parcial: "A dispensa diária para amamentação ou aleitação é reduzida na proporção do respetivo período normal de trabalho, não podendo ser inferior a 30 minutos", lê-se no diploma que está a ser revisto pelo Governo.
Amamentação é um dos objetos de polémico anteprojeto
O Governo aprovou no final do mês passado em Conselho de Ministros várias alterações à Lei do Trabalho, nomeadamente no que toca à licença para a amamentação.
Atualmente, não existe um limite temporal para amamentar, mas o executivo quer limitar até aos dois anos e idade e exigir a apresentação, de seis em seis meses, de um atestado médico.
Em entrevista à TSF e ao Jornal de Notícias, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social disse haver abusos por parte de algumas trabalhadoras que usavam de forma abusiva a licença para amamentar para trabalhar menos horas.
As declarações foram fortemente contestadas por associações e sindicatos que defenderam que o problema não estava nas mulheres mas sim nos empregadores, garantindo que ainda hoje existem muitas trabalhadoras que não usam a redução de horário por temer represálias.
A Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) recebeu este ano apenas uma queixa "feita por uma mulher referente à violação do direito de dispensa para a amamentação", mas não recebeu qualquer denúncia por parte da entidade empregadora de trabalhadoras que estariam a abusar desse mesmo direito, contou à Lusa a presidente da CITE, Carla Tavares.
Os sindicatos dizem que estes números não são representativos do que se passa nas empresas e garantem que "continuam a receber relatos" de problemas que acontecem um pouco por todo país, em especial nos trabalhos com maior presença de mulheres, como o setor da saúde, restauração, comércio ou da indústria.
"Tivemos vários exemplos de limitações e até situações extremas" de trabalhadoras impedidas de usar a licença de amamentação, disse à Lusa Fátima Messias, coordenadora para a Comissão de Igualdade entre Mulheres e Homens da CGTP-IN.
A sindicalista admitiu não ter dados sobre queixas, mas garantiu que "o direito à amamentação ou à aleitação continua a ser um direito muito pressionado pelas entidades patronais", o que leva muita mulheres a desistir 'a priori' de um direito previsto na lei.
"As situações do assédio laboral acabam por criar limitações, intimidações e auto-condicionamentos por parte de muitas trabalhadoras", alertou Fátima Messias, reconhecendo que estas situações dependem muito das mentalidades de quem gere as equipas.
"Quando se trata de rentabilizar o pouco pessoal que se tem, atira-se por terra direitos essenciais para as crianças e para as mães", acusou.
Fátima Messias considerou que a legislação ainda em vigor "é positiva em matéria de maternidade e paternidade" e que não deve ser alterada, uma vez que "o direito da amamentação para a mãe e da aleitação para o pai já está devidamente clarificado".
"O problema são as violações, porque é que o Governo, em vez de atacar as violações patronais e as limitações, ataca as mães e as crianças? É uma coisa desumana, absurda, maquiavélica. Sabe-se que há violações, sabe-se que há mulheres que são pressionadas, grávidas que são despedidas, mas em vez de atacar os infratores, atacam-se as grávidas e as crianças", sublinhou.
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