É "uma situação criminosa e uma violação do direito à habitação e da Lei de Bases da Habitação em matéria de despejo", disse a ex-deputada, em declarações à Lusa.
Helena Roseta considera "violenta" e "completamente abusiva" a atuação da autarquia de Loures, liderada pelo Partido Socialista (PS), a que pertenceu durante muitos anos e em nome do qual redigiu a Lei de Bases da Habitação (Lei n.º 83/2019).
"Um despejo administrativo não pode ser feito destas maneiras. A Lei de Bases da Habitação é muito clara sobre isso", constata, lembrando que "as pessoas não foram ouvidas, não foram encaminhadas".
"Quando há coisas ilegais, as autarquias têm o poder de fiscalizar e demolir", mas o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) "não permite fazer despejos administrativos", que estão regulados pela lei de bases e pelo código civil, sublinha Helena Roseta.
Um despejo administrativo "que não foi decidido por tribunal tem de obedecer à Lei de Bases da Habitação. Isto não foi decidido por tribunal nenhum", ressalva,
"Há um simples mandado administrativo do senhor presidente da Câmara a dizer para deitar abaixo porque é ilegal. Pois, eu sei que é ilegal, mas o que é que faz? As pessoas também são ilegais? O que é que faz às pessoas? Não pode fazer isto", critica, considerando que "o abuso de poder", quando "feito por quem é eleito, ainda é pior".
A lei proíbe o despejo administrativo sem garantia prévia de uma solução alternativa. "Onde é que está a solução alternativa? Isto é violação direta, grosseira", qualifica, lembrando que o artigo 13.º da Lei n.º 83/2019 "foi muito difícil de conseguir", mas "é clarinho".
Além disso, "no caso de haver despejos, as pessoas têm de ser avisadas num prazo razoável", sublinha.
"Foram 48 horas, mas 48 horas não foi dias úteis, foi 48 horas sábado e domingo, (...) totalmente fora das regras. Eles tinham de garantir às pessoas apoio judiciário. Onde é que está o apoio judiciário das pessoas?", pergunta.
Questionada sobre o recurso às demolições por executivos camarários socialistas (Loures, Amadora, Odivelas), Helena Roseta, que deixou de ser militante do PS em 2007, para se candidatar como independente à Câmara Municipal de Lisboa, encabeçando o movimento Cidadãos Por Lisboa, comentou: "Lamento profundamente que nem sequer cumpram a lei e nem tenham em consideração que foi uma lei aprovada pelo Partido Socialista na Assembleia da República."
A arquiteta adiantou ainda que "vai aparecer uma carta aberta" para recolher assinaturas contra a atuação da câmara de Loures.
A autarquia de Loures iniciou na segunda-feira uma operação de demolição de 64 habitações precárias, onde vivem 161 pessoas, no Talude Militar.
Segundo o município, no primeiro dia foram demolidas 51 casas, tendo as operações prosseguido hoje, às primeiras horas da manhã.
De acordo com dados recolhidos por um deputado municipal e elemento do Vida Justa, hoje "foram demolidas pelo menos quatro casas", antes de a autarquia suspender as operações "enquanto se analisa" o despacho do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, com data de segunda-feira à noite e que decretou que a Câmara Municipal de Loures fica "impedida de executar o ato de demolição" de habitações no Bairro do Talude Militar.
Entretanto, as famílias desalojadas pernoitaram em tendas e numa igreja local, segundo o Vida Justa. "O apoio da Câmara de Loures a estas pessoas volta a não ser nenhum", lamentou Miguel Dores, do movimento.
A Câmara de Loures aconselhou as famílias a deslocarem-se aos serviços sociais na Casa da Cultura, em Sacavém, e solicitar apoios. "Foram disponibilizadas alternativas habitacionais no mercado de arrendamento, com possibilidade de apoio financeiro à caução e à primeira renda", segundo fonte da autarquia.
No entanto, para o movimento Vida Justa trata-se de um "não apoio", uma vez que os moradores não irão conseguir aceder ao mercado da habitação.
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