Manuela Ramalho Eanes, fundadora e presidente honorária do Instituto de Apoio à Criança (IAC), defendeu, numa entrevista dada ao Diário de Notícias (DN), que a divulgação de uma lista de nomes de crianças imigrantes na Assembleia da República, como fez o líder do Chega, "é ilegal, inconstitucional e eticamente condenável".
Além disso, na opinião de Manuela Ramalho Eanes o Estado "e todos os seus órgãos" devem proteger as crianças, "mesmo quando essa proteção implica limitar a atuação abusiva de representantes eleitos".
"É ilegal, por violar normas de proteção de dados e da infância; inconstitucional, por ferir a igualdade, privacidade e dignidade; e é eticamente condenável, por expor crianças ao preconceito", explicou, sublinhando que "as crianças não podem ser usadas como arma política".
Para a presidente do IAC de 1983 até 2013, a democracia "deve acolher e proteger a todos, inclusivamente os que estão contra a democracia e a combatem". Porém, a tolerância, "pensada para proteger as minorias, torna-se ineficaz quando a maioria não reconhece esse princípio".
A leitura em público de nomes de crianças para sugerir que "não são portuguesas" viola o direito internacional, a constituição portuguesa, a lei da proteção de dados e os princípios mais elementares da dignidade humana", lembrou na mesma entrevista.
E no caso em questão - de um deputado ler nomes de crianças imigrantes em pleno Parlamento -, "não é apenas uma violação de privacidade: é uma violação de princípios fundamentais do Estado de Direito democrático, da dignidade da pessoa humana e dos direitos da criança".
Para Manuela Ramalho Eanes não há dúvida que "a utilização dos nomes das crianças como critério de origem étnica promove a discriminação e marginalização das Crianças e suas famílias", o que "viola" o "princípio estruturante" da ordem jurídica portuguesa que "assenta na dignidade humana".
Durante a entrevista, em que elencou vários direitos das crianças para estruturar a sua posição, Manuela Ramalho Eanes deixou ainda um alerta: "As Crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral [...]. O Estado tem, pois, o dever de proteger a Criança contra estigmas, xenofobia e exposição indevida".
Recorde-se que o presidente do Chega, André Ventura, divulgou, em plenário da Assembleia da República (AR) uma lista de nomes de crianças admitidas numa escola portuguesa, sugerindo que são mais as que "não são portuguesas" do que as portuguesas.
Apesar de toda a polémica e controvérsia que esta atitude teve, o líder do Chega, já disse que "voltaria" a fazê-lo.
Esta terça-feira, Manuela Ramalho Eanes vai receber da Câmara Municipal de Lisboa a Medalha de Honra da Cidade. A cerimónia terá lugar pelas 18h, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, em reconhecimento do empenho da agraciada nas causas socais, especialmente na defesa dos direitos das crianças.
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