O presidente da Câmara Municipal de Loures esclareceu a posição da autarquia quanto às demolições no bairro do Talude Militar.
Num vídeo enviado às redações, mas também publicado nas redes sociais, o presidente da câmara de Loures defende que as “construções ilegais" no Bairro do Talude e semelhantes "são inaceitáveis” e que não foi nem será a última intervenção da câmara neste sentido: "Esta não foi a primeira intervenção, nem será a última".
“As construções ilegais colocam em causa a segurança, a salubridade e a dignidade das pessoas", defendeu.
Ricardo Leão garante vai continuar a apoiar as pessoas afetadas e acusou figuras públicas e movimentos políticos de se aproveitarem da pobreza e da fragilidade.
"Há movimentos e associações e figuras públicas que em nome de uma suposta solidariedade acabam por promover a indignidade. A ideia de que basta construir uma barraca, ocupar ilegalmente um terreno ou instalar sem regras para ter de imediato uma casa é profundamente desonesta para com as mais de mil famílias que estão em espera por habitação municipal, mas também para as que cumprem, que aguardam com dignidade e confiam nas regras e nas instituições", disse.
O autarca socialista acrescentou mesmo que desde o início do seu mandato já foram demolidas cerca de 250 construções idênticas, todas com o mesmo objetivo: “defender a segurança das pessoas”.
“E se tivesse havido um incêndio? Um curto-circuito? Uma tragédia? Quem é que respondia? Eu. Enquanto presidente da Câmara Municipal de Loures era a mim que cabia a responsabilidade”, afirmou Ricardo Leão.
Quanto à situação específica do bairro do Talude, Leão faz questão de fornecer também alguns dados. Afirma que 43% das pessoas que viviam nesse bairro tinham uma morada oficial fora do concelho de Loures e que apenas 29 famílias recorreram ao apoio social da autarquia. Às onze famílias com crianças, diz Leão, foram dadas propostas de acolhimento que foram recusadas pela maioria.
“Antes da operação, durante a operação e depois da operação o apoio continuou e continua disponível, apesar de nenhuma das pessoas abrangidas ter pedido ajuda antes nem estarem inscritas em qualquer programa”, acrescentou o presidente da câmara de Loures.
De momento, o autarca diz que há três famílias que estão alojadas em hotéis, três a serem já apoiadas no sentido de conseguirem alojamento definitivo e outras três ou quatro situações que estão em avaliação no mercado privado de arrendamento.
“Antes da intervenção na zona do Talude, todas as pessoas foram informadas e abordadas pessoalmente pelos serviços da câmara municipal”, esclareceu o autarca.
Importa relembrar que uma das críticas feitas à câmara municipal foi exatamente o facto de os moradores terem sido notificados das demolições na sexta-feira anterior durante a tarde.
Questionada sobre o facto de de esse período impossibilitar o recurso ao sistema judicial para contestar a decisão, a vereadora que tutela a Polícia Municipal, Paula Magalhães respondeu: "Pronto, mas [durante o fim de semana] têm tempo para fazer a retirada das suas coisas, que é o objetivo da notificação."
Nem todos concordam: o movimento Vida Justa acusa a Câmara Municipal de Loures de impedir o acesso ao direito dos moradores do Bairro do Talude Militar, uma avaliação apoiada por um advogado especialista em Direito Administrativo.
MP abriu inquérito à demolição no Talude
Em causa está a demolição de, pelo menos, 64 barracas neste bairro de Loures, assim como o despejo de 161 pessoas que moravam no local, em condições precárias.
Na segunda-feira, dia 14 de julho, foram demolidas 51 casas precárias, a que se somaram mais quatro na terça-feira. A operação foi entretanto suspensa após o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa ter aceitado uma providência cautelar. Uma situação que veio culminar esta quarta-feira na abertura de um inquérito por parte do Ministério Público à situação.
Em comunicado, a Procuradoria-Geral da República confirmou ao Notícias ao Minuto que “na sequência das informações divulgadas nos últimos dias pela comunicação social, o Ministério Público da comarca de Lisboa decidiu abrir um inquérito.”
A averiguação do ministério surge depois de a autora da Lei de Bases da Habitação, Helena Roseta, ter admitido à agência Lusa fazer uma denúncia ao Ministério Público contra a Câmara de Loures, por "abuso de poder" nas operações de demolição de casas precárias neste bairro.
Críticas surgem dentro do próprio PS
Numa carta aberta, ex-governantes e deputados do PS manifestaram "profunda indignação e preocupação" com "a demolição do teto de dezenas de famílias".
A carta, com o título "sobre a demolição de princípios e de barracas", foi lançada na terça-feira por "militantes e simpatizantes do PS", e somava mais de uma centena de assinaturas. Para estes socialistas, demolir barracas "sem garantir soluções habitacionais alternativas, adequadas e imediatas" contraria os "princípios constitucionais e estatutários" e "mancha a credibilidade e o compromisso ético que o PS deve assumir perante os cidadãos".
Também o líder parlamentar do PS teve algo a dizer sobre a situação, reconhecendo que as ações do presidente da câmara de Loures, não transmitiram “empatia e socialismo”, mas defendeu que o episódio não põe em causa os pilares socialistas.
Já o Secretário-geral do PS, José Luís Carneiro, disse ter sido informado, pela Câmara de Loures, que foram tomados "todos os cuidados" com as pessoas afetadas pela demolição de construções ilegais.
"Garantem-me da Câmara Municipal de Loures que todos os cuidados houve em relação ao diálogo que foi feito com os respetivos cidadãos que foram confrontados com esta decisão. Garantem-me isso e, portanto, quero crer que assim foi", disse o líder do PS aos jornalistas em Beja.
Outras reações
Já Marcelo Rebelo de Sousa mantém-se em silêncio quanto a críticas. Em declarações aos jornalistas à margem das comemorações dos 50 anos da diocese de Santarém, disse apenas que a situação “tem de ser tratada e abordada de forma efetiva e duradoura", para evitar "a sensação de tapa aqui, remenda acolá, mas o problema global não está a ter solução".
Ao contrário, o candidato presidencial Luís Marques Mendes, que não há muito tempo dizia não ter informação suficiente para comentar, mostrou-se mais crítico da situação.
Esta quarta feira, em Santarém, o social-democrata admitiu que "há ali uma situação ilegal, é verdade. Mas a Câmara foi conivente durante anos. E, por isso, no momento em que quer fazer as demolições, devia ter encontrado primeiro um alojamento provisório, temporário, e só depois fazia as demolições. Ou seja, o contrário do que acabou por ser feito".