Para Felisberta, 77 anos, tudo começou em 2021, quando o marido, então com 82 anos, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC).
"Nesse mesmo ano teve uma sepsia e teve uma meningite e ficou em cadeira de rodas. Ainda recuperou alguma coisa, mas hoje está em cadeira de rodas e não anda. A única coisa que faz sozinho é comer", contou à Lusa.
Para as rotinas matinais, como levantar da cama, lavar e vestir o marido, Felisberta tem ajuda, mas no resto do dia e da noite é a única cuidadora.
Recorda como, entre outras coisas, teve de aprender a fazer o esvaziamento da bexiga, depois de o marido ter estado algaliado cerca de um ano.
Inicialmente, teve ajuda da equipa de enfermagem, mas "depois o resto é a prática" e dia após dia ir tentando fazer "da melhor maneira possível".
Conta que o mais custa fisicamente é mudar o marido da cama para a cadeira de rodas ou vice-versa. Já psicologicamente diz que o mais difícil é lidar com o feitio do marido, que "não admite que precisa de ajuda".
Chegou à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) aconselhada por uma assistente social, que lhe perguntou se não gostaria de ir a uma reunião de cuidadores.
Foi e continuou a ir todas as terças-feiras. Vai pelo ambiente, mas também pelo que aprende com as experiências dos outros cuidadores, porque todos passam por "situações completamente diferentes" em que "cada um age da melhor maneira possível".
"É muito bom porque este bocadinho alivia a cabeça e estamos noutro ambiente", salienta, acrescentando que "é bom sentir que não se está sozinho na situação".
Além das reuniões semanais, Felisberta Veiga usufruiu de dois meses de descanso do cuidador, durante os quais o marido ficou instalado numa Estrutura Residencial para Idosos (ERPI), da Misericórdia de Lisboa.
"Foi uma maneira de eu desanuviar da rotina que tinha, do ter de fazer isto, ter de fazer aquilo, que às vezes é um bocadinho complicado", explicou.
A diretora de Desenvolvimento e Intervenção de Proximidade da Ação Social da SCML destacou como a instituição "tem tido uma preocupação especial com os cuidadores informais", salientando que o cuidador "é aquela pessoa que garante o bem-estar da pessoa cuidada, mas ao mesmo tempo também tem de garantir o seu próprio bem-estar".
Etelvina Ferreira contou que, depois de um estudo realizado em 2008 sobre cuidadores informais, a SCML lançou em 2014 uma iniciativa para proporcionar um período de descanso aos cuidadores.
Trata-se de uma colónia de férias, cuja duração pode ir de três a cinco dias, durante a qual a instituição garante a prestação de cuidados de saúde à pessoa cuidada.
De acordo com a responsável, a adesão ao programa de férias nem sempre é tão elevada quanto a organização gostaria, possivelmente por o cuidador sentir culpa por tirar dias de férias quando a pessoa cuidada está ali.
No entanto, garantiu que quem vai gosta e explicou que todos os dias há um programa, que tanto pode incluir uma ida ao cinema ou a um museu, um passeio ou cuidados de beleza, mas também sessões de informação.
Além destes programas, Etelvina Ferreira adiantou que a SCML tem outros serviços para o cuidador, nomeadamente um centro de recursos para cuidadores informais, onde é dada formação sobre temas tão diversos como a prevenção dos acidentes domésticos, noções básicas de alimentação e da administração da própria alimentação ou o estatuto do cuidador informal.
Existe também um serviço de atendimento, um grupo de autoajuda e ações públicas para as quais os cuidadores informais são convidados.
De acordo com a responsável, qualquer pessoa que seja cuidadora informal e viva na Área Metropolitana de Lisboa pode aceder a estes serviços, adiantando que a SCML apoia cerca de 600 cuidadores, metade deles com estatuto.
Disse ainda que não há lista de espera, uma vez que se consegue ir gerindo ao longo do ano as necessidades de descanso dos cuidadores, apesar de admitir que, naturalmente, há mais pedidos de cuidadores para usufruir de descanso durante os meses de verão.
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