O dirigente do Sindicato Nacional da Guarda Prisional, Frederico Morais, revelou, esta quinta-feira, estar "surpreendido" pelo facto de o Estado português ter pagado mais de um milhão e meio de indemnizações a reclusos - que avançaram com queixas no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH).
"São mais 300 mil euros do que aquilo que se sabia", referiu Frederico Morais ao Notícias ao Minuto, acrescentando que esse dinheiro "devia ter sido aplicado nas cadeias na condição de reclusão de reclusos" e explicando que o Estado português é "condenado [pelo TEDH] a pagar multas pelas condições desumanas em que os reclusos estão a cumprir as suas penas".
Sobre o relatório divulgado, esta quinta-feira, pela Provedoria de Justiça, Frederico Morais disse "lamentar que mais uma vez se volte ao mesmo e não se ouçam os intervenientes" e sublinhou ser um "relatório tendencioso".
"O sindicato pede para ser interveniente antes de o relatório sair", esclareceu, tendo em conta o que consta no relatório sobre o provedor ter encontrado vários indícios de maus-tratos a reclusos. No entanto, o dirigente sindical referiu que quando só se ouve um lado é-se "tendencioso".
Frederico Morais reiterou que "a Provedoria da Justiça não deveria ser partidária e devia ter uma avaliação genérica, ouvir todas as partes".
"No ano passado, pedi uma reunião de urgência à provedora [Maria Lúcia Amaral], onde expus todos estes pontos e pedi para sermos ouvidos. Não adiantou", destacou. "O sistema prisional voltou a ser tendencioso e o grupo visado são os guardas prisionais".
"Quem faz o relatório é a provedora - que agora é ministra da Administração Interna [Maria Lúcia Amaral] - e que põe em causa o Ministério Público", disse, notando que o Ministério Público não vai de encontro ao relatório apresentado pela Provedoria da Justiça.
O que está em causa?
Esta quinta-feira, foi divulgado que, em seis anos, o Estado português pagou mais de um milhão e meio em indemnizações a reclusos que avançaram com queixas no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH).
As contas foram feitas pelo Provedor de Justiça, que adiantou hoje os números no seu relatório anual do Mecanismo Nacional de Prevenção, que foi entregue durante a manhã à Assembleia da República e referente ao ano de 2024.
Desde a primeira indemnização paga em dezembro de 2019 até ao início de março de 2025 - um período de pouco mais de cinco anos -, o Estado português pagou 1.552.075 euros a reclusos que consideraram "que as condições de reclusão a que foram sujeitos no cumprimento de uma pena de prisão configuravam uma violação da proibição de tortura", lê-se no relatório do Provedor de Justiça.
Deste valor de mais de um milhão de euros, 18% - o equivalente a cerca de 273 mil euros - resultou de condenação do TEDH, 52% - ou seja, mais de 800 mil euros - resultou de acordo mútuo celebrado entre o Estado e o queixoso e 30% - cerca de 470 mil euros - de proposta apresentada pelo Estado português e aceite pelo TEDH.
Face a estes números, o Provedor de Justiça alertou para a possibilidade de o valor das indemnizações poder aumentar, uma vez que está também a crescer o número de queixas, que estão relacionadas com maus-tratos e falta de condições nas prisões. Este dinheiro "poderia ser investido numa melhoria das condições materiais do sistema prisional", lê-se no documento.
Provedoria encontra indícios de maus-tratos a reclusos
O Provedor de Justiça encontrou indícios de maus-tratos a reclusos nas prisões de Lisboa, Monsanto e Porto, uma agressão que não foi comunicada ao Ministério Público e uma nota clínica que ocultou a agressão de um guarda.
Estas conclusões constam do relatório anual do Mecanismo Nacional de Prevenção, que foi entregue esta manhã à Assembleia da República, referente ao ano de 2024, e onde surgem várias críticas ao atual funcionamento de vários estabelecimentos prisionais em Portugal.
Este ano, o Provedor de Justiça fez 50 visitas de monitorização a locais onde se encontram pessoas em privação de liberdade, no sentido de avaliar as condições em que se encontram e que tratamento lhes é dado. Além da visita às 10 maiores cadeias do país, foram também feitas visitas aos seis centros educativos, centros de instalação temporária para estrangeiros e espaços equiparados, hospitais psiquiátricos e postos e zonas de detenção das forças policiais.
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