Uma colombiana, de 34 anos, que enfrentou uma depressão crónica durante mais de duas décadas, desde a adolescência, tornou-se na primeira pessoa do mundo a passar por uma cirurgia para tentar reverter este quadro.
Segundo noticia o site brasileiro g1, Lorena Rodríguez, que vivia entre crises de ansiedade e episódios depressivos, submeteu-se, em abril deste ano, em Bogotá, a uma cirurgia de estimulação cerebral profunda com quatro eletrodos, realizada pelo neurocirurgião colombiano William Contreras.
Antes, a mulher sentia que vivia "por obrigação", em "piloto automático". "Sentia tristeza, vazio e uma ansiedade que não passava. Mesmo em momentos que deveriam ser felizes, eu não conseguia estar presente", disse ao g1.
A estes sentimentos, juntaram-se as enxaquecas, mas também uma dificuldade acrescida em executar tarefas tão simples como levantar da cama. "Entendi que não era uma fase, mas uma condição clínica", lembrou.
Depois da cirurgia, a administradora de empresas, que tentou inúmeros tratamentos sem sucesso duradouro, sente que voltou "a ver a luz".
Lorena conheceu o trabalho o médico William Contreras por acaso, quando acompanhou uma sobrinha a uma consulta do neurocirurgião. Quando soube que o especialista também tratava de casos relacionais com transtornos do humor, escreveu-lhe, em dezembro de 2024, a relatar o seu caso. Assim, decidiram testar na colombiana a estimulação cerebral profunda (DBS, na sigla em inglês), no Hospital Internacional da Colômbia.
Este procedimento cirúrgico consiste na implantação de eletrodos no área subgenual do córtex, também conhecida como área 25 de Brodmann, associada à regulação do humo, e no braço anterior da cápsula interna, que conecta áreas do pensamento racional a estruturas emocionais.
"Usamos quatro eletrodos — dois por hemisfério — para atingir simultaneamente essas regiões. É a primeira vez no mundo que essa abordagem 'multitarget', direcionada a múltiplos alvos, é feita para depressão resistente", disse o neurocirurgião William Contreras ao g1, que sublinha que, até à cirurgia de Lorena, não havia nenhuma publicação científica que relatasse procedimentos semelhantes.
"Quando todos os tratamentos convencionais falham, a DBS oferece modulação contínua e reversível dos circuitos cerebrais ligados ao humor e à motivação. O objetivo é ajustar a atividade elétrica dessas áreas para aliviar os sintomas", explicou o especialista.
De uma forma simples, depois de serem identificados os pontos exatos do cérebro onde será feita a estimulação são implantados os eletrodos (fios muitos finos), que são ligados a um neuroestimulador, que envia impulsos elétricos para "regular" a atividades dos circuitos cerebrais.
Entre 40% e 60% dos pacientes apresentam uma melhoria significativa dos sintomas, enquanto 20% a 30% chegam a uma remissão duradoura.
"Tinha medo, mas se não tentasse, estaria a trair a parte de mim que ainda acreditava na vida. Entrei no centro cirúrgico com medo, mas também com fé”, disse Lorena.
Inicialmente, a mulher sentiu dores de cabeça e cansaço, mas reconheceu, imediatamente, pequenas mudanças, que continuam a acontecer.
"É como voltar a ver a luz, como se a luz estivesse entrando por frestas que antes estavam fechadas", contou. "Voltei a fazer planos sem medo. Ainda sou eu, mas agora tenho espaço para viver, não só resistir. Escolhi a vida mais uma vez — e, desta vez, com esperança real", frisou.
Para o neurocirurgião William Contreras, este tipo de caso é um marco para a medicina latino-americana.
"A novidade no caso da Lorena é que realizamos uma cirurgia baseada diretamente nos sintomas. A condição dela incluía vários circuitos cerebrais: ruminação, culpa, ansiedade e tristeza — cada um envolvendo redes diferentes. Um único eletrodo por hemisfério – que é o padrão para esse tipo de cirurgia – seria insuficiente", explicou.
"Por isso, usamos quatro pequenos sensores que medem a atividade elétrica do cérebro e analisam como as áreas se conectam entre si. Assim, conseguimos ajustar a estimulação de forma personalizada para cada região envolvida. No dia seguinte à cirurgia, ela me disse que sentia como se tivesse tirado um peso do peito", completou.
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