O ex-deputado pró-democracia de Macau e cidadão português Au Kam San foi detido, na quinta-feira, e ficou sujeito à medida de coação de prisão preventiva por ser suspeito de violar a lei relativa à defesa da segurança do Estado.
A detenção já foi condenada pela União Europeia (UE), mas o que está em causa?
A detenção de Au Kam San é a primeira ao abrigo da lei de segurança nacional da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), que entrou em vigor em 2009 e foi revista em 2023.
"A polícia entregou ao Ministério Púbico um indivíduo de Macau que terá conluiado com as forças externas anti-China, o qual, na sequência da investigação preliminar, se encontra preso preventivamente por suspeita de violar a Lei relativa à defesa da segurança do Estado", lê-se num comunicado divulgado na quinta-feira.
Em causa estiveram "fortes indícios da prática do crime de estabelecimento de ligações com organizações, associações ou indivíduos de fora" de Macau "para a prática de atos contra a segurança do Estado".
Sem referir o nome completo do antigo deputado, a Polícia Judiciária declarou que um residente de Macau de apelido Au, de 68 anos, foi detido por "suspeita de violação da lei relativa à defesa da segurança do Estado" e por ter agido em "conluio, desde 2022, com uma organização anti-China" estrangeira.
À Lusa, uma fonte confirmou tratar-se do ex-deputado Au Kam San, também com 68 anos. A Teledifusão de Macau escreveu, além disso, que, ao que "foi possível apurar, o suspeito é o ex-deputado Au Kam San".
UE "condena detenção". China e Macau "repudiam" declarações
Já este sábado, a União Europeia condenou a detenção do ex-deputado de Macau e admitiu preocupação com a "erosão" das liberdades na região.
"A UE condena a detenção de Au Kam San, cidadão da UE e antigo deputado de Macau, no dia 30 de julho, sob acusações de [violar a Lei de] Segurança Nacional", avançou um porta-voz do Serviço Diplomático de Bruxelas, em comunicado.
Sublinhando que esta "constitui a primeira aplicação da Lei de Segurança Nacional da Região Administrativa Especial de Macau desde a sua adoção em 2009", o Serviço Europeu para a Ação Externa da UE afirmou que o acontecimento "agrava as preocupações existentes sobre a contínua erosão do pluralismo político e da liberdade de expressão" na região.
Bruxelas recordou, ainda, que "o respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais é um elemento central da Lei Básica de Macau e da máxima 'um país, dois sistemas'".
Macao: Statement by the Spokesperson on the arrest of Au Kam San
— European Union Office to Hong Kong and Macao (@EUinHKandMO) August 2, 2025
For full statement: https://t.co/jBi1RJyWMB
Em resposta, a representação diplomática de Pequim em Macau repudiou "os comentários ilusórios" de Bruxelas e manifestou "descontentamento".
"Exortamos a União Europeia a deixar imediatamente de fazer observações e acusações infundadas sobre os assuntos de Macau e a deixar imediatamente de interferir nos assuntos de Macau e nos assuntos internos da China!", afirmou o porta-voz do Comissariado para os Assuntos de Macau do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China, liderado por Liu Xianfa.
Também o governo de Macau repudiou "de forma veemente" as afirmações da União Europeia sobre o "procedimento criminal e as ações de execução preventiva" tomadas contra o ex-deputado.
"O governo da Região Administrativa Especial de Macau [RAEM] repudia de forma veemente e opõe-se firmemente às afirmações proferidas pelo Serviço Europeu para a Ação Externa sobre o procedimento criminal e as ações de execução preventiva previstas da lei recentemente desencadeados pela RAEM nos termos da Lei relativa à defesa da segurança do Estado", afirmou um comunicado do Gabinete de Comunicação do governo de Macau.
O governo sublinhou também que "as autoridades policiais e judiciárias da RAEM trataram sempre o caso escrupulosamente nos termos da lei, e o direito processual do arguido é efetivamente garantido nos termos da lei".
IL vai propor à Assembleia da República condenar detenção de Au Kam San
Por cá, a Iniciativa Liberal (IL) já anunciou que vai propor à Assembleia da República um voto de condenação relativamente à detenção de Au Kam San e pedir ao Governo que solicite esclarecimentos às autoridades chinesas.
De acordo com o projeto de voto ao qual a Lusa teve acesso, a detenção do ex-deputado "é a primeira ao abrigo da legislação de segurança nacional de Macau, aprovada em 2009 e revista em 2023, e ocorre num contexto de acelerada repressão das liberdades fundamentais na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM)".
O documento redigido pela IL afirma que o Estado português tem o "dever de acompanhar com rigor" o caso e posteriormente garantir o respeito pelos compromissos assumidos na Declaração Conjunta Luso-Chinesa de 1987, documento vinculativo ao abrigo do direito internacional.
A Assembleia da República "não pode permanecer em silêncio face à prisão de um concidadão que dedicou a sua vida à defesa da liberdade, nem pode ignorar a degradação do regime de liberdades em Macau", lê-se.
Au Kam San, sublinhe-se, foi eleito deputado pela primeira vez em 2001, beneficiando do alargamento do número de lugares previstos na Lei Básica da RAEM, mantendo-se em funções até 2021. Durante esse período fez parte do grupo da ala democrata de Macau.
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