Numa cerimónia na sede da ONU, em Nova Iorque, em que se assinalou o 30.º aniversário do genocídio de Srebrenica, António Guterres - representado pelo seu chefe de gabinete - expressou solidariedade pela "pior atrocidade em solo europeu desde a Segunda Guerra Mundial", frisando que, nesse verão de 1995, "uma geração inteira foi perdida".
"Hoje, recordamos e homenageamos as vítimas. Prestamos homenagem à força, dignidade e coragem dos sobreviventes e das famílias. E reconhecemos duras verdades: há 30 anos, a ONU e o mundo falharam com o povo de Srebrenica", afirmou Courtenay Rattray, ao ler o discurso preparado por Guterres.
"Este fracasso coletivo não foi um acidente da História. Foi o resultado de políticas, propaganda e indiferença internacional. (...) E devemos garantir que as vozes dos sobreviventes de Srebrenica continuam a ser ouvidas, combatendo a negação, a distorção e o revisionismo", defendeu.
O líder da ONU destacou que a determinação e bravura dos sobreviventes, das famílias das vítimas, e em particular das "Mães de Srebrenica", foram essenciais para as deliberações do Tribunal Internacional para a Ex-Jugoslávia e do Tribunal Internacional de Justiça, que concluíram que o massacre de Srebrenica constituiu um genocídio.
Ao recordar este acontecimento, o ex-primeiro-ministro português olhou igualmente para o presente, observando que o discurso de ódio está novamente a aumentar, alimentando a discriminação, o extremismo e a violência.
"Vemos novamente a glorificação dos criminosos de guerra. Voltamos a ver as mesmas correntes perigosas que antes levavam a crimes de atrocidade. Caros amigos, não podemos ignorar estes sinais de alerta", frisou Guterres, sem mencionar casos concretos.
O secretário-geral, que está no Brasil onde participou na cimeira dos BRICS (bloco das economias abrangentes), apelou a todos os Estados-membros da ONU para que cumpram a sua responsabilidade partilhada de defender as lições de Srebrenica, de preservar a verdade histórica e de proteger a dignidade humana.
"Enfrentemos a negação com a verdade e a impunidade com justiça. E honremos as nossas obrigações ao abrigo do direito internacional humanitário e do direito internacional dos direitos humanos, bem como da Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio", apelou.
Este discurso de Guterres ocorre num momento em que muitas organizações e líderes internacionais criticam a atuação de Israel na Faixa de Gaza, cenário de uma guerra entre as forças militares israelitas e o grupo extremista Hamas que já provocou mais de 57 mil mortos, a maioria civis.
Alguns países e organizações de direitos humanos falam abertamente em genocídio, mas Guterres tem afirmado repetidamente que tal classificação é uma responsabilidade dos tribunais competentes, não da própria ONU.
A cerimónia de hoje foi coorganizada pelo Departamento de Comunicações das Nações Unidas, o gabinete do conselheiro especial para a Prevenção do Genocídio e a missão permanente da Bósnia-Herzegovina junto das Nações Unidas.
Durante o evento, foi observado um momento de silêncio em homenagem às vítimas.
Em maio do ano passado, a Assembleia-Geral da ONU criou um Dia Internacional em Memória do Genocídio de Srebrenica na Bósnia-Herzegovina, apesar da oposição da Sérvia. Tendo em conta essa votação, esse dia é assinalado a 11 de julho, próxima sexta-feira.
Em julho de 1995, a cinco meses do final da guerra civil iniciada na Bósnia-Herzegovina durante a primavera de 1992, cerca de 8.000 homens e rapazes muçulmanos bósnios em idade de combater foram mortos na sequência do assalto militar das forças sérvias bósnias a este enclave do oeste.
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