O templo de Na Tcha, santuário chinês, e as Ruínas de São Paulo, fachada da antiga igreja católica da Madre Deus, do século XVII, encontram-se lado a lado no centro histórico de Macau. Logo pela manhã, famílias posam para a câmara, na parte inferior da emblemática escadaria de pedra das ruínas.
"Gosto da calçada [portuguesa], é especial", diz à Lusa Alina Wang, turista de Xangai. O filho, de oito anos, York Xiong, complementa: "Os edifícios são bonitos". Nem todos na família, porém, conhecem a história por detrás do 'ex-líbris' de Macau, reduzido à fachada após incêndios. O patriarca, Li Zijian, ia jurar que tinha sido destruído durante a II Guerra Mundial.
Ao lado, outra família, esta de Xi'na, associa a imagem das ruínas a um bombardeamento japonês na Grande Guerra.
Há 20 anos, no dia 15 de julho de 2005, o centro histórico de Macau, um conjunto de 22 monumentos que combina arquitetura portuguesa e chinesa, entrou para a lista do património mundial da UNESCO.
Esse marco para o património da cidade, refere à Lusa a Direção dos Serviços de Turismo, trouxe mais turistas a Macau, alterando o perfil do visitante, que deixou de cruzar a fronteira apenas para jogar.
"Isto mudou a imagem de Macau de uma 'cidade do jogo' para um destino cultural, diferenciando-o na região Ásia-Pacífico", sublinhou à Lusa aquela direção.
Desde 2005, acrescentou o departamento governamental através de email, o setor do turismo tem vindo a desenvolver-se a um "ritmo acelerado". As chegadas de visitantes a Macau dispararam de 16,14 milhões, em 2005, para 34,93 milhões, em 2024.
Um estudo aos visitantes conduzido pela direção de Turismo este ano revela que 53,3% dos turistas chegam ao território para visitar o património, ultrapassando aqueles que querem fazer compras (33,7%) e os que estão mais interessados na gastronomia (18,5%).
Para Lei Ip Fei, historiador e ex-membro do conselho do Património Cultural de Macau, o estatuto da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, na sigla em inglês) elevou o perfil global de Macau. "O jogo impulsionou a economia a curto prazo, a cultura deve impulsionar o crescimento a longo prazo", disse à Lusa.
A economia de Macau depende profundamente dos casinos, que representam 80% das receitas públicas, sendo que o Governo da região semiautónoma chinesa espera arrecadar, este ano, 79,8 mil milhões de patacas (9,1 mil milhões de euros) com o imposto sobre o jogo.
Mas se, por um lado, a inscrição do património veio ajudar a diversificar o perfil do turista, há que pensar naqueles que vivem na cidade diariamente, notou Ka Nok Lo, vice-presidente da Associação dos Embaixadores do Património de Macau.
Em entrevista à Lusa, o responsável alertou para a necessidade de não transformar Macau "numa Disneylândia", defendendo o equilíbrio entre turismo e as necessidades dos residentes.
"Os museus devem servir a comunidade, assim como as bibliotecas, as livrarias, e não apenas os turistas", considerou.
Ka sublinhou, por outro lado, que ainda falta entregar aos visitantes a narrativa que une os vários locais distinguidos pela UNESCO. "Não há uma história que ligue estes monumentos", disse.
O Governo de Macau tem como um dos principais objetivos procurar a diversificação económica, com a finalidade de reduzir a sua dependência em relação à indústria do jogo através do desenvolvimento de novos setores.
E estes são o turismo e lazer integrados, a medicina tradicional chinesa (MTC) e "big health", os serviços financeiros modernos, a alta e nova tecnologia, as convenções, exposições, desporto e o comércio.
Mas o apelo dos casinos é incontornável, como as famílias de Xangai e Xi'an deixaram em evidência. No dia seguinte ao passeio pela zona histórica de Macau, a visita à região iria continuar nas estâncias modernas do jogo concentradas na zona de Cotai, realçando o duplo papel de Macau como destino de jogo e património cultural.
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