"Nós avançámos muito significativamente, mas o processo está a meio, não está concluído. (...) Avançámos muito sobretudo nas três áreas - educação, ação social e saúde -, mas é preciso aprofundá-lo e avançar para outras áreas", alertou a autarca, durante uma intervenção num fórum sobre o poder local, hoje realizado no Iscte, em Lisboa.
Luísa Salgueiro considerou que é preciso não defraudar as expectativas das pessoas, referindo-se aos resultados de um estudo apresentado durante o encontro e que revelaram que a maior parte dos cidadãos tem mais confiança nas suas autarquias locais do que na administração central.
A autarca defendeu ainda a necessidade de uma nova lei das finanças locais, que já estava a ser preparada em negociações com anteriores Governos, para permitir que o processo de descentralização de competências não tenha um impacto financeiro negativo nas autarquias e também para que estas tenham um financiamento claro e objetivo, que não dependa anualmente da boa vontade expressa no Orçamento do Estado.
"À partida, esta neutralidade [do financiamento das competências transferidas] está garantida. Porém, à medida que vão sendo desenvolvidas e exercidas essas competências, as autarquias vão identificando necessidades que não estavam previstas, e, portanto, vamos tendo mais despesa", disse.
Luísa Salgueiro destacou ainda que outro dos desafios da descentralização é a falta de trabalhadores qualificados na administração local e problemas de escala em muitos municípios, sobretudo os mais pequenos, o que foi visível na aplicação das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
"Houve candidaturas e recursos que foram perdidos por falta de capacidade técnica", disse.
A responsável exemplificou ainda que muitos dos grandes municípios reivindicam "mais competências do que as que lhes foram transferidas, designadamente na área da educação e da saúde", mas a ANMP tem alertado que "essa possibilidade iria aumentar as assimetrias, porque poucos municípios teriam condição de contratar médicos ou de contratar professores no quadro financeiro em vigor".
"Não podemos avançar com o processo de descentralização que enviese o país e que acentue as assimetrias", concluiu.
Luísa Salgueiro destacou ainda que, além da educação, ação social e saúde, "há muitas outras competências que ainda não estão suficientemente tratadas", como nas áreas do património, cultura e infraestruturas.
O estudo "Os portugueses, a desconcentração e a descentralização das políticas públicas" foi apresentado hoje em Lisboa no Fórum das Políticas Públicas 2025 por Pedro Adão e Silva, presidente do Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do Iscte - Instituto Universitário de Lisboa, e teve como coautora Isabel Flores
Segundo o estudo, a maior parte dos cidadãos reconhece que existiram melhorias nas condições de vida no seu município nos últimos anos e considera que as autarquias são o nível que melhor consegue desenvolver políticas públicas.
Num comunicado, a ANMP congratulou-se por "uma ampla maioria de pessoas" valorizar, confiar e reconhecer o papel essencial do poder local no desenvolvimento do país, ao considerar que "as câmaras municipais e as juntas de freguesia são quem mais se preocupa com as pessoas" e os territórios, nomeadamente na prestação de serviços nas áreas da educação, segurança, ambiente, higiene urbana ou habitação.
Para a ANMP, o estudo demonstra que os cidadãos compreendem que "a implementação eficaz de políticas públicas exige proximidade e conhecimento dos territórios" e reconhecem que o poder local tem "melhores condições" para desenvolver essas políticas, sendo "desejável uma maior atribuição de competências às autarquias".
"A transferência de competências para os municípios e as entidades intermunicipais, sobretudo nas áreas da educação, saúde e ação social, está a traduzir-se numa melhoria visível da qualidade dos serviços prestados às populações, o que constitui um sinal claro de que é tempo de ir mais longe no aprofundamento e consolidação da descentralização política e administrativa", considerou a ANMP.
Segundo o estudo, as regiões Norte e Centro, ambas com 44%, são onde mais inquiridos consideraram que houve melhorias, seguidas pelo Algarve (40%) e Lisboa e Vale do Tejo (35%).
A região do Alentejo é onde os inquiridos são mais pessimistas, e apenas 28% têm a perceção de que os seus municípios melhoraram.
Os inquiridos revelaram também ter um "escasso conhecimento do processo de descentralização das políticas públicas", embora a maioria defenda mais transferências de responsabilidades para o poder local.
Larga maioria dos inquiridos neste estudo defendeu ainda que "deve ser reaberta a discussão sobre a regionalização" e que a decisão "deve ser tomada através de um novo referendo".
Na nota, a ANMP considerou que "é preciso avançar para a regionalização do país, com a criação das regiões administrativas, com órgãos diretamente eleitos pelas populações".
"As regiões administrativas, com legitimidade democrática, são um instrumento indispensável para um maior, melhor e mais equilibrado desenvolvimento do todo nacional", defendeu a associação.
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