O embaixador de Israel em Portugal, Oren Rozenblat, voltou a defender esta sexta-feira que "não há fome em Gaza".
Em entrevista à SIC Notícias, Rozenblat reagiu à avaliação feita pela Classificação de Fases de Segurança Alimentar Integrada (IPC), que pertence à Organização das Nações Unidas (ONU), afirmando que o relatório usa critérios diferentes em Gaza dos que usa no resto do mundo, para determinar que existe fome no enclave.
"Este relatório é muito interessante, porque a IPC tem um critério para a fome em todo o mundo, e outro critério para Gaza", argumentou o embaixador israelita, que, mais uma vez, defendeu que as imagens de alegada fome no enclave fazem parte da "campanha de propaganda do Hamas".
"Não há fome, nunca houve fome e ninguém morreu de fome em Gaza. Podemos ver crianças magras, mas é porque são doentes graves", reiterou, mostrando uma foto com uma mãe agarrada ao filho, esquelético, e o suposto irmão ao lado. "Se fosse verdade, a mãe e o irmão também seriam magros", defendeu.
Embaixador diz que Israel deixa entrar comida por "ética"
Em resposta às questões com que era confrontado durante a entrevista, Rosenblat argumentou ainda que Israel não tem qualquer obrigação em ajudar a Faixa de Gaza, segundo a Lei Humanitária Internacional - apenas a de deixar entrar ajuda internacional, e, mesmo assim, nem em todas as circunstâncias.
"Esta é a primeira guerra em todo o mundo em que um lado precisa de ajudar o outro lado com comida", afirmou, acrescentando "nós não precisamos de mandar comida".
"Nós precisamos permitir a entrada de ajuda humanitária, se isso não ajudar o inimigo, e claro que ajuda", defendeu. Mesmo assim, "nós fazemos isso devido à nossa ética, não por causa da Lei Internacional Humanitária".
E rematou: "Mais de dois milhões de toneladas de ajuda humanitária entraram em Gaza desde o início da guerra. É uma tonelada para cada cidadão".
500 mil pessoas enfrentam "condições catastróficas", segundo a ONU
A ONU, e várias outras organizações humanitárias, têm sistematicamente acusado Israel de barrar a entrada dos camiões de ajuda à porta do enclave.
A declaração feita agora pela IPC surge, por isso mesmo, após meses de alertas sobre uma situação de fome no território palestiniano.
"Esta é uma fome que poderíamos ter evitado se nos tivessem permitido. No entanto, os alimentos acumulam-se nas fronteiras devido à obstrução sistemática de Israel", afirmou Tom Fletcher, responsável pela coordenação dos assuntos humanitários das Nações Unidas, numa conferência de imprensa em Genebra.
Segundo o IPC, há mais de meio milhão pessoas a enfrentar "condições catastróficas caracterizadas por fome, miséria e morte". Há ainda "outros 1,07 milhões de pessoas - mais da metade da população - enfrentam níveis de emergência de insegurança alimentar aguda".
Para decidir se a situação é de fome, as Nações Unidas recorrem às suas agências especializadas sediadas em Roma - o Programa Alimentar Mundial (PAM) e a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) - que, por sua vez, dependem de uma ferramenta técnica: o IPC, que se baseia numa escala de padrões científicos internacionais.
Netanyahu rejeita que exista fome na Faixa de Gaza
As conclusões do IPC foram rejeitadas também pelo primeiro-ministro israelita, num comunicado citado pela agência France-Presse (AFP), onde afirma categoricamente que "Israel não tem uma política de fome. Israel tem uma política de prevenção da fome".
No comunicado, Netanyahu afirmou que "os únicos que estão deliberadamente a passar fome em Gaza são os reféns israelitas" do Hamas, raptados durante o ataque de 7 de outubro de 2023, no sul de Israel.
Guterres diz que a situação não pode continuar "impune"
Em reação à declaração de fome em Gaza feita pela agência da ONU, o Secretário-Geral da ONU voltou a apelar a um "cessar-fogo imediato", à "libertação imediata de todos os reféns" e ao "acesso humanitário total e sem restrições".
"Não podemos permitir que esta situação continue impunemente", afirmou Guterres, citado pela agência de notícias France-Presse (AFP).
Já o chefe de direitos humanos da ONU, Volker Turk, lembrou que "matar pessoas à fome para fins militares é um crime de guerra".
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