"Doenças do cérebro são um dos maiores problemas de saúde pública"

Artigo de opinião assinado por Rui Araújo, coordenador de Neurologia no Hospital CUF Trindade e da Unidade da Memória do Hospital CUF Porto.

Rui Araújo, coordenador de Neurologia no Hospital CUF Trindade

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Notícias ao Minuto
22/07/2025 08:45 ‧ há 11 horas por Notícias ao Minuto

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Artigo de opinião

"O cérebro é, à primeira vista, um órgão pouco impressionante: um novelo cinzento e gelatinoso com aproximadamente 1400 gramas, escudado por um robusto capacete de cálcio, que produz e guarda os nossos sentidos e sentimentos, conhecimentos e percepções, e a arquitetura dos movimentos,  e os transmitem através de extensões tentaculares em linguagem elétrica e bioquímica, entre departamentos complexos que a Ciência se esforça por mapear.

 

O cérebro é, efetivamente, estruturalmente pequeno para tamanha importância: ser centro de comando e biblioteca universal.

Não surpreende, assim, que as doenças do cérebro, por pequenas e localizadas que sejam, tenham um extraordinário impacto na vida das pessoas. O Dia Mundial do Cérebro, celebrado a 22 de julho, é uma oportunidade para gerar sensibilização para as doenças do cérebro que constituem um dos maiores problemas de saúde pública do mundo, sendo especialmente impactantes por vários motivos.

Em primeiro lugar pelo grau de disfuncionalidade que acarretam e pela sua natureza tendencialmente crónica, raramente resolvida numa convalescença de curta duração. Depois, obrigam com frequência, num curtíssimo espaço de tempo, a uma reestruturação completa das relações pessoais e profissionais da pessoa afetada e dos seus familiares. Adicionalmente, são doenças com uma perceção pública globalmente desfavorável, gerando por vezes sentimentos de vergonha, incapacidade e desvalor, ainda para mais quando as suas manifestações não se podem esconder por debaixo da roupa, como uma inestética, mas inofensiva cicatriz.

O conceito de “capital cerebral” foi definido como o conjunto do conhecimento, capacidades criativas e saúde cerebral, que permite que as pessoas alcancem o seu potencial enquanto elementos de sociedades e economias modernas. Um cérebro saudável não é só um órgão teórico a repousar na cabeça: é também musculatura eficaz capaz de trabalhar e fazer avançar o mundo. Por consequência, todas as possibilidades para aumentar o capital cerebral devem ser consideradas, nomeadamente, através da prevenção, diagnóstico e tratamento adequados.  

Em relação ao diagnóstico e tratamento, a investigação em neurociências tem sido frutífera. Em poucos anos assistimos a grandes avanços nas diferentes áreas da Neurologia. Por exemplo, na área do acidente vascular cerebral, temos hoje uma reforçada capacidade de tratamento para evitar um conjunto alargado de sequelas que até há poucos anos eram inevitáveis. As cefaleias, nomeadamente a enxaqueca, apresentam novas opções terapêuticas muito eficazes. Existem ensaios clínicos positivos para novas moléculas na Doença de Alzheimer. A investigação traduz-se, a médio e longo prazo, em benefícios concretos para as pessoas.

Os aspetos preventivos assumem também grande relevância. Sabe-se que a intervenção sobre certos fatores, como a hipertensão arterial, diabetes mellitus, défices auditivos, depressão, mas também sobre fatores de natureza social, como a poluição ambiental, a escolaridade e o isolamento, pode reduzir o número de pessoas que desenvolvem demência em praticamente metade.

As iniciativas comunitárias que equilibram os valores da autonomia e da proteção, como a habitação colaborativa, vão no bom sentido, no entanto, as famílias de doentes com demência sofrem ainda pesados custos diretos e indiretos com a doença. Na minha prática clínica, são cada vez mais frequentes o caso de cuidadores “sanduíche”, isto é, pessoas em idade ativa, com filhos menores a seu cargo, que se confrontam com a  necessidade de cuidar de um pai ou mãe que começa a desenvolver sinais de demência. São situações que requerem uma boa rede de suporte e capacidade financeira.

O investimento em capital cerebral tem um enorme retorno, quer numa lógica individual, quer no contexto socioeconómico. Uma estratégia centrada na promoção da saúde do cérebro - com um acompanhamento clínico diferenciado e disponível -  deve ser uma prioridade de sociedades ética e cientificamente evoluídas."

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